quinta-feira

Pausa para meditação

Um ano fecha as portas e prepara outras paragens.

Tudo que se pede tem objetivos bem claros – vida, amparo, preservação da auto-estima.

Mas a gente não quer só comida, a gente quer bem mais. Eu quero, tu queres, ele/a quer e nós também bom convívio, ideias, reconhecimento, sinais de visibilidade.

Não os 15 minutos de fama, entenda-se bem.
Não queremos o pouquinho, o precário, o triste. Visibilidade da boa é sentir-se pessoa, gente entre as gentes. Querer-se bem para poder amar o próximo e até o nem tão próximo assim.

Queremos boas novidades, bons filmes, criatividade, bons livros e melhores escolas e universidades. Saúde bem atendida e a tempo.

Crianças amadas, bem tratadas, que não precisem tornar-se adultas antes do tempo, por causa do sofrimento que não lhes compete sofrer. Que haja gente de coração, capaz de carinho e lucidez, daquela que o amor sabe dar.

O tão desejado mundo melhor precisa de gente assim, que prepare mais gente de boa qualidade para viver nele.


Então que 2010 seja assim para todos nós.
Que haja paz no mundo, compreensão e tolerância, amor e amizade em doses suficientes.


Amém.

Ótimas férias para todos.
* Imagem Egon Schiele

terça-feira

Quase férias








A arte que não mobiliza as faculdades físicas e mentais deve ser questionada. Pode ser várias coisas, mas não deve ser arte. A arte, seja visual, literária ou musical, deve ser como uma nova fase de vida a cada nova fase criativa. Nasce de uma dúvida, uma curiosidade, um susto, um desejo. A arte deve ser como uma onda que entra em nós pelos sentidos, acelera o sangue, aguça a sensibilidade e ilumina a inteligência.







O Caçador



O Caçador, de autoria da Ana Merege, tem 100 páginas e um preço de capa bem acessível: R$ 22,00. Se alguém quiser adquirir a obra, indicar uma escola para receber material informativo ou – uma coisa importante – dar uma força na divulgação, repassando a notícia do livro a quem possa se interessar, é só visitar o site da editora. Ou então contactar diretamente as distribuidoras parceiras, também listadas no site, em vários estados do Brasil.



Um Natal de pura alegria para os que passarem por aqui.
Um Natal que seja um comecinho da felicidade e da alegria de viver que lhes desejo para 2010.

segunda-feira

Barulho demais para dormir em paz





Foto Jean Haute-Garonne.



Na página da UOL datada de 11 deste mês, a entrevista de um climatologista alagoano faz balançar as convicções mais em voga a respeito de aquecimento global, do CO2 e outros assuntos assim tão atuais, que às vezes fazem pessoas mais sensíveis perderem o sono.

Luiz Carlos Molion – esse é o nome do moço – descrê das teorias vigentes sobre o clima do planeta, desacredita do diagnóstico que motivou o atual encontro de Copenhague, a Eco92, do Rio, e o Protocolo de Kyoto. Ele afirma ser o pioneiro dessa posição, nega que o aquecimento seja culpa do homem e nega o próprio aquecimento, nos termos aceitos quase consensualmente no mundo. Nega também que o carbono – que chama de “gás da vida” – produza os efeitos adversos sobre o meio ambiente que quase todos lhe atribuem, reconhecendo apenas que os combustíveis fósseis liberam substâncias nocivas, como o enxofre. Afirma ainda que a visão ecológica predominante hoje, na mídia e entre muitos que se dizem cientistas e pesquisadores, tem origem em interesses políticos e industriais.



Imagem Anchor. Árvore rendilhada.



 A entrevista, que vale a pena conhecer, pode ser lida na íntegra aqui.



A teoria do macaco ao infinito


Para o senso comum, quem se ocupa desse tipo de notícia e ainda por cima entra em minúcias e dados, como datas e referências midiáticas, simplesmente não tem mais o que fazer.

É um exercício de lógica, de qualquer maneira, e sempre se justifica pelos precedentes, que incluem desde Aristóteles até pesquisadores do início do século XX. Sem falar no interesse das pessoas em geral pelas possibilidades desses primatas, sempre ligados à teroria da evolução.

E se nada disso puder ser levado a sério, fica o lado curioso e engraçado da coisa.


Diretamente da Wikipédia, num texto datado de 25 de julho de 2009, leiam só:

“O teorema do macaco infinito afirma que um macaco digitando teclas ao acaso numa máquina de escrever por um tempo infinito, quase certamente chegará a datilografar algum texto, tipo as obras completas de William Shakespeare.

Nesse contexto, 'quase certamente' é um termo matemático de significado preciso, e 'macaco' não se refere a um macaco real, mas uma metáfora para um dispositivo que produza uma sequência casual de letras ad infinitum. O teorema ilustra os perigos do raciocínio sobre a infinitude, imaginando um número vasto mas finito, e vice-versa. A probabilidade de um macaco datilografar uma obra completa como o Hamlet de Shakespeare é tão tênue, que a chance de que isso ocorra durante um lapso de tempo da ordem da idade do universo é minúscula, mas não igual a zero.

 As variantes do teorema incluem múltiplos e até um número infinito de datilógrafos, e a meta varia entre uma biblioteca inteira e uma única frase. A história dessas asserções vem desde Sobre geração e corrupção, de Aristóteles, e De natura deorum, de Cícero, passando por Blaise Pascal e Jonathan Swift, e chegando finalmente às afirmativas modernas sobre os datilógrafos. No início do século XX, Émile Borel e Arthur Eddington usaram o teoria para ilustrar as escalas de tempo implícitas nos fundamentos mecânicos da estatística. Vários apologistas cristãos, por um lado, e Richard Dawkins, por outro, têm questionado a propriedade de se usarem os macacos como metáfora da evolução.






O interesse popular pelos macacos datilógrafos é sustentado por seu frequente aparecimento em literatura, televisão, rádio, música e na Internet. Em 2003, realizou-se uma experiência utilizando seis macacos de crista, da ilha indonésia de Celebes. Sua contribuição literária consistiu de cinco páginas em que se repetia inúmeras vezes a letra S.

A respeito do experimento, disse a BBC News, em 9 de maio de 2003: ‘Não há palavras que descrevam o caso dos macacos’.”


Nada mais verdadeiro: nada a declarar. O que não impede que se continue falando do assunto e, assim que alguma pesquisa ou teoria levantar uma pontinha sobre o tema, voltarão a aparecer textos e hipóteses novos ou requentados. Nada a declarar - por enquanto.







quarta-feira

Dúvidas tecnológicas


Por que toda vez que você entra num site para tirar dúvidas, a lista das fac traz todas as respostas imagináveis, menos a que responde a sua dúvida?


Por que não existe alguém do lado de lá que possa interagir com você do lado de cá?






sábado

Allende em Turim

Isabel Allende é uma das melhores contistas que conheço.
Opinião pessoal, é claro. Mas se você ainda não leu Contos de Eva Luna, leia que vale a pena.
Mais conhecida pelo autobiográfico Casa dos Espíritos, que deu um bom filme com Jeremy Irons, aquele gato, e Meryl Streep, é autora de mais 14 romances, um livro de memórias, três de contos e três peças para teatro (tá na Wikipédia, vai lá).

Mas a sobrinha de Salvador Allende não é só uma escritora das boas, mas uma mulher de ideias claras e opiniões definidas. Feminista (ainda), ela articula seus pontos de vista com grande propriedade e humor.
Achei uma delícia assistir ao vídeo aí abaixo. Podem conferir.







Primeira Fonte
tá jorrando de novo e espera seus leitores de braços bem abertos.

domingo

A propósito de estrelas



Ela já foi chamada poeta-pop.
Depois chegou-se à conclusão de que o título não esgotava o assunto.


É de Adília Lopes, poeta portuguesa de nosso tempo, o poema a seguir.




Não sei se me interessei pelo rapaz
por ele se interessar por estrelas
se me interessei por estrelas por me interessar
pelo rapaz hoje quando penso no rapaz
penso em estrelas e quando penso em estrelas
penso no rapaz como me parece
que me vou ocupar com as estrelas
até ao fim dos meus dias parece-me que
não vou deixar de me interessar pelo rapaz
até ao fim dos meus dias
nunca saberei se me interesso por estrelas
se me interesso por um rapaz que se interessa
por estrelas já não me lembro
se vi primeiro as estrelas
se vi primeiro o rapaz
se quando vi o rapaz vi as estrelas



Adília Lopes, in
Desfogados pelo vento.
A poesia dos anos 80, agora,
Antologia de Valter Hugo Mãe, Ed. Quasi





Mensagens 'proféticas'

Uma coisa.
Ando recebendo mensagens que falam do futuro próximo deste país (onde nunca dantes aconteceram coisas tão importantes) que se prepara para eventos como a Copa do Mundo de Futebol, em 2014, e as Olimpíadas Internacionais,  2016. São mensagens até engraçadas, às vezes, mas todas preveem que os brasileiros vão pagar muito mico por conta desses acontecimentos.
Também sinto certo frio na barriga, pensando nisso - o que tinha que ficar pronto até lá e não vai ficar, as repercussões desses eventos, a respondabilidade da turma aqui da casa, que nunca se sabe, sem falar na competência requerida para dar conta de tudo. Governos de todos os níveis, abram o olho; órgãos de segurança, segurem-se. Fazedores de superfaturamentos, por favor, deem uma colher de chá à reputação de nossa terrinha..
Restam os santos, alguns até brasileiros. Pode ser que exista um santo ou anjo especializado em proteger contra micos, para os quais convém começar a orar com fervor.


eu crio estados como quem cria bichos e hoje é dia de gatinha

quarta-feira

Hematófago



cego na frente do espelho
o escuro descendente do vampiro
morde a noite


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Para quem gosta de escrever

EXERCÍCIO DAS PROIBIÇÕES

Este exercício, usual em oficinas de literatura, foi extraído de uma oficina dada pelo crítico José Castello.

Escreva um conto, que tenha no máximo 5 mil caracteres com espaços, ambientado na praia de Copacabana.

As 100 palavras que constam da lista abaixo não podem ser usadas, estão proibidas. A idéia desse exercício é levar o aluno a refletir sobre as facilidades oferecidas por clichês, lugares comuns, e tudo o mais que escrevemos "sem pensar". Eles podem ser úteis para a publicidade, para o marketing, para a propaganda, até para o jornalismo – não para a literatura.

1- água de coco; 2- amendoim; 3- areia; 4- asa delta; 5- avião; 6- barco;
7- barraca; 8- barriga; 9- bermudas; 10- bíceps; 11- biquíni; 12- bicicleta
13- biscoito; 14- bola; 15- boné; 16- bronzeador; 17- bunda; 18- cachorro;
19- calçadão; 20- calor; 21- camarão; 22- caminhada; 23- campeonato; 24- canga;
25- cedê; 26- cerveja; 27- céu; 28- chapéu; 29- chinelo; 30- chuva; 31- cochas;
32- cooper; 33- COPACABANA; 34- conversa fiada; 35- domingo; 36- ducha;
37- esporte; 38- esteira; 39- estrela; 40- flacidez; 41- futebol; 42- futevôlei;
43- galera; 44- garota; 45- garotão; 46- ginástica; 47- horizonte; 48- ilha;
49- jornal; 50- livro; 51- lua; 52- mar; 53- mate; 54- mulher; 55- músculos;
56- namoro; 57- navio; 58- oceano; 59- óculos; 60- óleo; 61- ondas; 62- panfleto;
63- paquera; 64- patins; 65- peitos; 66- pelada; 67- peteca; 68- picolé; 69- praia;
70- prancha; 71- propaganda; 72- protesto; 73- protetor solar; 74- publicidade;
75- quiosque; 76- rádio; 77- rede; 78- refrigerante; 79- revéillon; 80- revista;
81- sábado; 82- sandália; 83- sexo; 84- show; 85- sol; 86- som; 87- soneca;
88- sorvete; 89- suco; 90- sunga; 91- suor; 92- surfe; 93- tanga; 94- tênis;
95- tira-gosto; 96- toalha; 97- trânsito; 98- turma; 99- vôlei; 100- voo-livre.

domingo

Lucubraçoes póstumas do marechal

Hoje, dia de comemorar a proclamação da república (assim com letra minúscula mesmo), dou voz ao marechal Deodoro da Fonseca, dono da festa.


Vocês não conheceram o Exército daquele tempo. Era bravo, íntegro, valoroso. Impetuoso, digno, abnegado. Merecia todo reconhecimento, toda honra, toda atenção. Era injusto que o postergassem, que o ignorassem ou não lhe atribuíssem o devido valor.

Primeiro foram aqueles quatro anos às voltas com os problemas criados por alguma inabilidade da Regência, mas acima de tudo pelo temperamento rebelde daquela gente – tinhosa, como eles mesmos se chamavam, – avessa a cabresto, indisciplinada por natureza. Tinha eu vinte e um anos, acreditava – como ainda acredito – na importância da ordem, do pulso firme. Disciplina é chave na vida militar, essa disciplina de máquina bem azeitada, de canhão que tem que estar pronto pra disparar na hora exata.

O povo não pensa nisso. Quer conseguir, não só o que ainda não tem, mas o que acha que vai perder. O povo se sente sempre ameaçado, tem medo que as coisas fiquem mais difíceis do que estão.

Ainda vejo a rua da Praia a ferver. Recife nunca mais seria a mesma cidade pacífica depois daquilo. O Antônio Pedro de O Progresso ajudou a inflamar os ânimos e, embora eu não pretenda condená-lo por seus artigos incendiários, ainda me parece que foi leviano o modo como conduziu seu jornal, que acabou se queimando no próprio fogo.

Os pobres sempre precisam de coisas de que ninguém se lembra, só eles. A coisa vinha de longe, da Europa, e uma das pontas veio estourar aqui. Lá eram os donos de terra, a riqueza nas mãos de poucos. Aqui era isso e mais a questão dos escravos. Convenhamos, panos para mangas. Juntaram-se os que não tinham nada com os que não tinham coisa nenhuma, uma aliança perigosa, já que os torna muito mais numerosos e reúne cobiça e muita raiva acumulada. Qualquer gotinha faz transbordar, e quando isso acontece em geral é uma inundação. De todo modo, era uma demonstração de estultícia daquela gente acreditar que eu poderia querer a restauração da monarquia.

Mas as questões da política são assim, surpreendentes e cheias de incoerências. Muitas cabeças, opiniões demais, sempre se acaba num rumo de irracionalidade. O importante é que o dignitário do momento mantenha a cabeça fria, e que vise mais o bem da pátria do que a manutenção do poder nas próprias mãos.

O que aconteceu no Paraguai foi maior; durou seis anos e liquidou mais de três dezenas de milhares de soldados. Exército e Marinha em ação, coisa de importância. Rendeu-me a capitania, mas derramou muito sangue. No Paraguai então morreu gente a dar com o pé, pelas armas e pelas doenças que se espalharam. O país também nunca mais iria sarar. Contraiu uma anemia crônica depois dessa guerra, e hoje vejo o estrago que causamos lá. Ainda bem que a culpa não foi nossa, mas do Solano.

Fico daqui do último andar desse prédio, antigo QG, onde depois construíram o ministério da Guerra quando o Rio de Janeiro era a Capital – bons tempos! –, vendo o movimento, e fico meio tonto. Parece um formigueiro. Em frente, o campo de Sant’Ana, o sobrado de esquina onde eu morava, os prédios vizinhos, tudo ainda muito familiar, apesar dos anos. Era uma casa bem típica, salas na frente, chão de tábuas corridas, os quartos enfileirados. Ainda vejo o grupo de sofá e poltronas de palhinha em volta da mesinha oval, de pernas altas torneadas, na sala de visitas, a mesa comprida de jantar, o lustre de cristal, o teto de madeira trabalhada. Está um pouco estragado agora. Tombamento só serve para o que se vê por fora, é o diabo.

Aqui por trás desses prédios começou a primeira favela, assim que libertaram os pretos. Subiram o morro, arrumaram casebres para se abrigarem de sol e chuva.
Dizem que o imperador exclamou “estão todos malucos!”, quando ouviu a notícia no dia 16. Homessa. Essa gente da nobreza não consegue identificar o que se passa com os pobres.


Maravilhosa, essa garota ucraniana



Kseniya Simonova é uma garota ucraniana, que acaba de ganhar o concurso Talentos da Ucrânia.

Ela utiliza uma grande caixa iluminada, música dramática, a imaginação e sua habilidade de 'pintar' com areia para interpretar a invasão e ocupação do seu país de 1941-45.

Ela conta uma história completa apenas movimentando a areia na mesa, usando somente as mãos para criar estas imagens.

quinta-feira

Passado com passas




 
o abraço dobrado
e o bom passadio
de passas no arroz
era a vida dos dois
lareira no frio
praias no verão e
a vida passando
como o ferro passa
e o trem já passou

depois do passado
em que a história acontece
ficou só presente
onde nada mais passa

o presente é um roteiro

que nem começou





As time goes by










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Em tempo: veja aqui outros lances sobre o caso da Uniban - ECA!
Veja também Milton Ribeiro, devidamente nauseado.

segunda-feira

A minissaia desabou sobre a universidade


Maior sucesso. Ela foi à aula de vestido cor-de-rosa beeeem curtinho, desfila daqui, desfila dali. Mexeu com a cabeça dos meninos/as mais e menos conservadores/as, agitou as massinhas, despertou sentimentos desencontrados – inveja, insegurança, escrúpulos residuais, medo do diferente e, talvez mais que tudo, desejos tanáticos, vontade de agredir, de descarregar a raiva, os ódios e as frustrações em alguém, tipo joga bosta na Geni. Rebu e xingamentos, baixo calão liberado.


As primeiras reações vieram de pessoas circunspectas, mestres, jornalistas do politicamente correto e também genuínos libertários, todos condenando a reação da turba, defendendo a liberdade de se apresentar como bem se desejar, o direito sagrado de não saber se vestir de acordo com a ocasião e até de não ter noção de estética. Não era caso para tentativa de linchamento e ameaça física à moça - essa sim, uma infração grave. Nem podia ser, porque a minissaia é coisa do tempo de nossas avós e está incorporada aos usos da civilização ocidental. À primeira vista, a porção sensata das pessoas concordou com essa primeira reação.


Mas aí veio a segunda, partida da direção da universidade: alegava-se provocação, rebeldia, resistência à voz da autoridade por parte da minissaia rosa. Não se disse nada sobre a violência sofrida por ela, a coação e o risco que correu. Só a provocação e a rebeldia da agredida foi mencionada. E tome expulsão, pena máxima para infratores numa instituição de ensino. Nem tchum pros instigadores da agressão, os puxadores do cordão catártico, os possíveis/prováveis linchadores. Talvez tivessem recebido alguma sanção (branda) se tivessem chegado a lesar fisicamente a provocadora, que de qualquer modo iria para a rua.


Entre ter um trabalhão para investigar, identificar e punir os numerosos agressores, perdendo talvez dez ou quinze clientes pagantes, foi muito mais fácil pegar a vítima – que era uma só e não desfalcaria tanto as finanças da instituição. E de quebra, ainda se agradaria aos pais e responsáveis de mentalidade estreita dessa galera que, reunida, pode ficar tão feroz e perigosa, mas individualmente é apagada e pobre de espírito.


Pitboys, uni-vos para zelar pela moral e pelos bons costumes, e vossas ações acharão acolhida entre os escribas e fariseus manipuladores, que põem o lucro acima de qualquer valor.

A essa altura, leio a manchete na Gazetaweb.com de O Globo:
Expulsão de estudante por minissaia chega à Câmara
Deputados propõem à Comissão de Educação e Cultura audiência pública para que reitoria de universidade exlique expulsão de aluna por causa da roupa

E aqui, MEC quer esclarecimentos da Uniban sobre explusão de aluna
Resolvi esperar pra ver. Ao menos, restava uma esperança de sensatez no fim do túnel.

E agora, afinal, aqui, leio que a universidade desistiu da expulsão da aluna.

Cada um vai tirar suas próprias conclusões.

Quanto à minha, sem querer continuar nesse reino obscurantista da tal universidade, só queria saber o que que esse pessoal tem contra a minissaia.

UP-DATE: Veja aqui o excelente texto de Contardo Calligaris sobre o caso da Uniban.





Também estou no Primeira Fonte, jornal eletrônico das queridas amigas Esther Lúcio Bittencourt e Ana Laura Diniz, que volta a circular em nossos monitores. Uma leitura instigante, legal e rica de ideias.

sexta-feira

Lévi-Strauss, ficamos te devendo


Difícil para novatos no assunto, riquíssima em conteúdo e absolutamente inovadora, assim é a obra de Claude Lévi-Strauss, o pesquisador que o mundo perdeu nesta semana. Vale a pena conhecer melhor sua história e seu trabalho.


Pode-se dizer que "aquela sensação de busca que temos em todos os seus textos", como diz Ondina Fachel Leal, caracteriza o estilo do antropólogo mais bisbilhoteiro do século XX.


Visita a Mariana

Sempre uma delícia, essa gracinha de cidade de céu imbatível e ambiente de sossego que é um oásis pra quem vive correndo de bala perdida. Também pesa, e muito, o fato de rever pessoas e pessoinhas que moram no coração da gente.
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O Himalaia em Búzios
“Pedro Álvarez Cabral e os Tupinambás nunca souberam que há 520 milhões de anos Búzios era uma cadeia de montanhas da altura do Himalaia.”

Esse e outros dados aqui.
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Superinteressante

Conversando é que a gente se entende - Dicionário de expressões coloquiais brasileiras é o nome do livro sobre expressões, bordões, ditados e gírias de nossa língua, com a respectiva pesquisa sobre as origens e distorções, às vezes hilárias, que lhes deram outro sentido. O autor é o professor de português Nélson Cunha Mello. Vale a pena.

terça-feira

Um comentário sem pretensões





O que a vida e o mundo mudaram dos anos 1980 para cá é uma grandeza. Nossos pais e avós não imaginariam tanta mudança em tão pouco tempo.

Verdade que já se anunciavam novidades naqueles anos em que ainda havia algum espaço para o conservadorismo. Em abril de 1980 morria Jean-Paul Sartre, um dos responsáveis pela revolução dos costumes, que já começara desde o meio do século XIX, principalmente depois de Freud, mas andava bem devagar, comparada ao ritmo acelerado que viria depois dos sixties do século seguinte. Sartre e seus seguidores ajudaram a implantar de vez, nas sociedades ocidentais, a visão mais libertária – e, comparada à do século anterior, mais libertina – da moral vigente.





Em dezembro morria John Lennon – integrante dos Beatles, esses roqueiros inesquecíveis – que deixou também sua marca na mudança da mentalidade política, como ativista pela paz. Também em dezembro de 1980 morreu o nosso Nélson Rodrigues, revolucionário das letras, que aqui no Brasil escancarava a realidade do comportamento humano contra toda hipocrisia, em seu teatro e nas crônicas, contos e romances.


Só esses quatro nomes já seriam suficientes para ajudar a entender as mudanças sociais e filosóficas que dariam o empurrão final no rumo do que somos hoje. Mas houve muito mais depois deles. E nem vamos falar dos avanços da tecnologia, que ficam pra outra despretensão.

PS - Não se impressionem com o excesso de freuds por aqui. Foi só coincidência.






Recadim

Acho que devo um pedido de desculpas pela ausência – não a desses dias, em que, além da viagem, o furacão teve outros, com licença da palavra, epicentros – problemas de saúde em família, atividades de trabalho etc. As desculpas são pela falta de visitas e comentários aos amigos mais queridos. Não consegui tempo e acesso fácil. Vamos tentar agora reatar nossas trocas, quase sempre muito gostosas. Até já, meninos e meninas.


Imagem Claudia Porto.

Pronto.
Depois do mergulho, e sem muitas novidades além do visual e das cores, estamos aí.
Obrigada pela espera e pelo carinho
 
 

Umbigo não fala mas faz silêncio

Queridos, o Umbigo vai dar um tempo.
Quem imagina que blog não medita, não sabe nada de blogs.
Na verdade, há muito a refletir, e não é só por causa da situação geral do país ou do mundo. Aproveito uma viagem para repensar o jeitão azul, o peixão que nos acompanha há seis anos e uma série de mesmices que começa a dar nos nervos. O que (ainda) está vivo, tem que mudar.
Suspensos no mesmo fio, os blogs da casa tiram uma soneca.
Beijos a todos e até a volta.

sábado

Rio, capital das Américas



Arriscamos, torcemos e levamos.

Há quem tenha torcido contra (foram muitos). Mas a turma daqui é muito mais de festa do que de crítica, e a maioria ganhou de lavada. Nem sei se chegou mesmo a haver uma torcida contra, propriamente, mas com certeza havia certo receio de que o Rio vencesse os outros candidatos. As dúvidas se explicam, nessas ruas esburacadas, nessas viagens de ônibus mal conduzidos por motoristas de mal com a vida (deles), nessas linhas insuficientes de metrô. Se explicam pela corrupção vigente nos diferentes níveis de poder – a mesma que impediu Chicago de sediar os jogos de 2016. Sem falar em nossos famosos pivetes.

As dúvidas provieram, talvez acima de tudo, do medo de que nossos bandidos vencessem mais essa parada e conseguissem espantar os gringos e indignar o mundo. Mas o mundo não é a vendinha do seu José, que obedece às ordens dos traficantes e fecha o estabelecimento a qualquer dia e hora. (Embora, não convém esquecer, esses mesmos cascas-grossas tenham posto pra correr o Carrefour – uma empresa multinacional – que fazia a alegria da classe média da Usina da Tijuca e dava emprego ao numeroso pessoal do bem que habita as favelas, mas não obedecia a ordens literais e boçalmente estúpidas.) Eles têm o poder da truculência e de um armamento sofisticado (e o apoio de figurões da classe A), mas não é possível que prefeitura, estado e governo central unidos se deixem abater por essa corja que nos envergonha.

A esmagadora maioria dos condomínios cá de baixo não ousa expor a cara, quando alguém propõe que os moradores se organizem para reivindicar algum sossego e um modo seguro de estancar a favelização crescente dos bairros do Rio. Há mesmo certa pusilanimidade no modo como esses burguesinhos clássicos (nós, no caso) se escondem, assustados como esquilos diante de um cachorro. Embora vergonhosa, essa atitude se explica pelas contrapartidas que atitudes mais corajosas têm desencadeado – mortes brutais e até a tortura, vingança preferida por todos os covardes em todos os tempos.

Apesar de tudo isso e do resto, o Rio é mesmo um lugar de confraternização. O Rio prefere sempre a alegria, haja o que houver, e às vezes a gente se surpreende com a força dessa alegria para salvar situações embaraçosas ou nos tirar do sufoco. Além disso, existem as polícias, cujo contingente deve crescer aos milhares de homens, e o exército – uh, là là – que vai pra rua, como aconteceu na Eco92, lembram?

Então, e como tudo está bem quando acaba bem, vamos vibrar com e pelo o Rio, a vitória do Rio, agora de novo capital, não só do Brasil como das Américas, até o fim das Olimpíadas de 2016. E se tudo der certo, quem sabe, para sempre.





Rio 2016: ministro dos Esportes canta na festa da vitória

segunda-feira

Vincent

Starry night com Don McLean



No Inscrições, um poema para Vincent.

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Blogagem coletiva
Como você escolhe seus amigos?

Não sei se a Milene se importa muito com uma blogagem atrasadinha.
Liga não, Milene, é que achei o tema bem interessante e resolvi arriscar.
Se você gostar, já fico bem contente, combinado?


Nem sei se amigo se escolhe ou se encontra.

Acho que tenho encontrado meus amigos pela vida. Porque amizade é um pouco como o amor - é à primeira vista ou então é uma descoberta súbita, quando você já conhece alguém mas ainda não tinha prestado muita atenção. Amizade, assim como amor, se acende de repente.

Não me lembro de algum dia ter premeditado ser amiga de alguém, e pensado deve ser bom ser amiga dele/a, vou levar pra minha coleção. Então, em meu caso particular pelo menos, meus amigos têm sido bons encontros.

Pela web acontece a mesma coisa. Aqui não se vê o rosto, vê-se o texto ou a imagem que ela posta. E como certos textos são irresistíveis e certas imagens têm um encanto diferente, vou procurar seu/sua autor/a. E quase sempre é assim - Fulana faz poemas que me deixam em estado de graça, Fulano escreve de um modo irresistível ou ela fotografa com uma competência que me dá inveja.

Nem sei se posso chamar isso de critério. É casual, é bom demais.

quarta-feira

Notículas



Começou hoje. Com chuva e nuvens, um friozinho de serra aqui neste bairro desta cidade decadente. As flores existem, apesar de tudo, mas não sei por quanto tempo ainda vão ter condições de aparecer nos anos do futuro. Mesmo quando recomeçar a primavera.


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História incompleta está completa agora.
Continuará para sempre incompleta, ainda assim.
Me deu muito prazer vê-la ir se desenrolando, acho que o método de trabalho deu certo, criou certa disciplina e mostrou resultados antes do habitual.
Valeu, blogger.
Acho que vou repetir a dose em outra história que anda varrumando minha cabeça.
Não sei vocês, mas eu gostei da experiência.
Espero que possa ter sido bom pra vocês também.

domingo

Ser ou não ser, eis o mosaico

Texto participante da blogagem coletiva proposta pela Elaine Gaspareto.




Quem pode dizer que está inocente do que acontece a sua volta? Não me atrevo. Nem mesmo posso ter certeza do grau de participação que me cabe em cada acontecimento. Mas que cada um joga seu dadinho nessa grande roleta que é a vida, isso joga sim. Nem me venham dizer que fui a única culpada de tudo que aconteceu a mim ou aos mais próximos, mas é mais que provável que, mesmo sem ter consciência disso, eu tenha atrapalhado a vida de alguém ou dado um empurrãozinho em quem já estava com o pé do lado de fora da janela.

É estranho olhar a vida por esse prisma. É como olhar o mundo através desses cristais facetados, em que as imagens se repetem e multiplicam em ângulos diferentes, cores alteradas, e deixam quem olha fascinado com a diversidade de formas, querendo dar conta de todas elas. É como ver de perto as imagens de Vic Muniz, composições de milhares de imagens mínimas que se perdem na visão de conjunto de cada quadro.

Mas, assim como cada um de meus semelhantes, eu sou um mosaico. Minhas escolhas envolvem fatores e condições que não estavam previstas ou não poderiam ser bem avaliadas antes de se tornarem uma contingência ao vivo.

Quantas vezes quis alguma coisa que deu em outra, errada ou não. Quantas outras vezes acertei em cheio sem querer muito, tateando um pouco no escuro, indecisa quanto ao lado a seguir. Amei alguém que poderia ter sido tudo, e encontrei outro que efetivamente foi tudo. Detestei pessoas que hoje seriam indiferentes e não tiveram qualquer peso em minha vida. Amei gente que não merecia, sofri por causas que não eram minhas, falei mal de pessoas que não eram más, prestei homenagem a quem não valia a pena.

Mas como o que se faz da vida não pode ser o que a vida faz da gente, insisto em ser sujeito de minhas decisões e seguir os rumos que prefiro. Tento amar muito, não sei se sou capaz de querer tanto bem quanto imagino. Tento me realizar no trabalho, mas ainda não encontrei os instrumentos certos – e pior, talvez nas cavernas onde ainda não consegui jogar luz, não queira encontrar. É preciso lidar com as próprias resistências e a idealização, ninguém vive sem elas. Então, se eu disser que sou cem por cento alguma coisa, estarei na certa mentindo. E se quiser aparecer com cara de anjo, vou motivar as pessoas a procurar meus cascos de coisa ruim. É da sabedoria popular: ninguém acredita em auto-elogio. O povo sabe das coisas.

quinta-feira

A poesia segundo Cabral e o caderninho

Lavo a alma lendo boa poesia. No antigo caderninho de onde tiro poemas, pequenas crônicas e textinhos inclassificáveis, achei esse texto, escrito não sei quando:


Acredito na poesia como uma experiência que não para de se renovar, e ao longo do tempo pode tornar as pessoas melhores. O exercício da poesia induz o autoconhecimento, sem o qual ninguém sai do lugar. Dá a medida e o peso do que é preciso saber, porque ilumina a razão com a experiência mais íntima das coisas e dos acontecimentos. Aliás, poesia é acontecimento.

Poesia não serve para rimar palavras ou burilar frases de efeito. Ela relativiza as defesas que criamos para nos aprisionar; remove as máscaras com que tentamos nos esconder ou nos engrandecer. Desmistifica toda fantasia que não exista para celebrar, mas para enganar os outros e a nós mesmos. O exercício da poesia revela a inutilidade de nossos álibis. É o par de asas a nosso alcance.

Acredito profundamente na poesia, porque aproxima estranhos e diferentes, semeia um conhecimento para o qual não existem currículos, desperta as pessoas para uma liberdade que nada pode destruir. Porque consegue dizer o que nenhuma outra linguagem comunica. Um bom poema é o simulacro de um momento na vida de alguém, com sua grandeza e fragilidade.

Acredito na força da poesia, capaz de revelar beleza em uma fruta, um corpo ou numa guerra; numa paixão ou num canto de casa empoeirado, na lama da estrada, nas nuvens de chumbo – melhor ainda se o arco-íris não aparecer.

E porque não se impõe nem obriga a nada, acredito que a poesia é a expressão mais verdadeira da difícil liberdade humana.


Imagem Iman Maleki. Menina lendo.



Foto David Pichiottino. Lampadaire nuit.


‘A palo seco’*, poema de João Cabral de Melo Neto, poeta brasileiro nascido em Recife, 1920, que morreu no Rio de Janeiro em 1999, fala de um conceito de poesia que me parece coisa de gênio (que ele era).


Aqui vão alguns trechos:

1.1 Se diz a palo seco
o cante sem guitarra;
o cante sem; o cante;
o cante sem mais nada;

(...)

4.1 A palo seco canta
o pássaro sem bosque,
por exemplo: pousado
sobre um fio de cobre;

a palo seco canta
ainda melhor esse fio
quando sem qualquer pássaro
dá o seu assovio.


* Do espanhol, a expressão Cantes a palo seco diz respeito a um tipo de música pertencente à categoria dos palos flamencos. São tradicionalmente cantados à capela ou, em alguns casos, acompanhados apenas por algum instrumento de percussão. O poema completo pode ser encontrado aqui.

sábado

Tempo trançado














Às vezes, quando o passado se trança com o presente, as coisas se complicam e nosso tempo acaba ficando assim, meio em tiras, o perdido e o ganho convivendo em uma paz aparente que a qualquer momento pode se esfarelar e fazer desandar a vida.



atrás da porta do armário
numa sacola de camurça
ruça
deixo ficar os dias
que se recusam a virar passado

as pétalas e
as cartas sem resposta
um dia se esfarelam sem aviso
mas há desejos de longa duração
amores refugados
e algumas alegrias
dessas que os poetas antigos chamavam peregrinas
que não se quer esquecer

quem disse que só temos
o presente?
ou dito de outro modo
talvez nosso presente seja
exatamente
uma sacola velha de camurça

quarta-feira

Com licença do Lau Siqueira, poesia sim


Antologia bloética: Poemas e Poetas, um novo espaço para a poesia. Uma boa ideia em forma de blog, que vale a pena conhecer.

Não consigo entender essa coisa de que poesia não vende.
Nâo? Mas todo mundo lê e gosta.
E já que agora a tendência é ler cada vez textos mais curtos, por que não poemas?
Não acho legal essa tendência, estou só constatando uma realidade que a internet confirma a cada dia.
A internet, essa faca de tantos gumes.
Favorece a preguiça de ler, mas traz até os leitores textos e autores que não seriam lidos fora da família ou dos amigos mais próximos. A rede torna mais difícil ler durante muito tempo seguido, tem apelos demais, interesses de mercado que literalmente pulam diante dos olhos e dispersam a atenção, além da luminosidade que irrita muitos olhos e da diversidade de atrações.
Mas há os leitores de fé, esses que não dispensam um livro nas mãos e um espaço de paz para aproveitar na leitura que lhes dá prazer, e continuam bem conscientes da falta que faz um bom livro.

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Um rapazinho!
Uma nova primavera –
e passaram sessenta anos.

Koi Nagata (1900-1997)

Quem diria! Sessenta e cinco, para ser mais exata. Mas continua a ser ele.

domingo

À deriva



Ele falava às vezes como quem desembarca de estrelas trituradas - farpas que ela reencontrava nas curvas do caminho do dia; falas rascantes capazes de quebrar o sono em pedaços.

Esse pedaço de texto esquecido serve de epígrafe a um comentário sobre o filme de Dhalia. Mas o filme é muito, muito mais.

terça-feira

Pérolas

Chris Marker
La jetée, o curta de Marker que inspirou 12 Macacos, de Terry Gilliam.


No blog Luzia - Crítica de Cinema, uma análise bem desenvolvida desse clássico de Chris Marker.


A arte que não mobiliza as faculdades físicas e mentais deve ser questionada. Pode ser várias coisas, mas não deve ser arte. A arte, seja visual, literária ou musical, deve ser como uma nova fase de vida e um novo olhar sobre o mundo. Dela sempre nasce uma dúvida, uma curiosidade, um susto, um desejo. A arte deve ser como uma luz que entra em nós pelos sentidos, acelera o sangue, aguça a sensibilidade e ilumina a inteligência. A arte que não produz alguma inquietação não cumpre bem o que se espera dela.

Personalidade que encarna essa filosofia, Chris Marker está bem caracterizado nessa entrevista em que ele fala de suas atividades múltiplas, seus interesses, suas realizações. Cinema, fotonovela, CD-Rom, instalação de vídeo são alguns dos meios que experimentou em sua longa carreira, numa obra permeada da poesia das imagens e do profundo conhecimento das pessoas e suas histórias. Mais sobre ele aqui.


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Pérola negra e rara:






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O Rio e as Olimpíadas de 2016




Dê só uma olhada!
Vale pelo visual de nossa cidade, que é mesmo de tirar o fôlego.
Mas por enquanto, tudo não passa de uma expectativa.
Veja também aqui.

quinta-feira

A história na gaveta




Estava no fundo do baú (metafórico – na verdade era uma prateleira de armário dessas em que a gente só mexe na faxina do Natal). Não sei em que ano foi escrito, mas deve ter sido há muitos, porque estava datilografado por Berta, uma amiga que passou por minha vida antes de 1990 – quando o primeiro XP entrou em cena lá em casa – como um cometa desses que aparecem de quando em quando e somem sem deixar vestígios. Berta era um barato de pessoa.

O original datilografado já era uma segunda via, porque a primeira foi manuscrita. Foi num dia de mudança que o encontrei, quase por acaso, e não me lembrava bem dele. Na confusão das caixas empilhadas e da arrumação na casa nova, só o reencontrei três dias depois, mas ler mesmo só em uma semana ou pouco mais. As primeiras emendas, a lápis, devem ter sido feitas logo que Berta me entregou as folhas, agora um pouco amareladas.

À medida que ia lendo, percebi por que me esquecera dele. Contava uma história perigosamente parecida com a de um parente distante, o que deve ter sido uma peça do inconsciente, e fiquei com medo que alguém lesse e o identificasse. Por isso ele dormiu tanto tempo fora de casa, quer dizer, fora das gavetas a que teria direito. Mas ali estava, um texto de 125 laudas batidas à máquina por uma profissional competente e caprichosa. Olhei-o durante algum tempo sem a menor idéia do que faria com ele. Publicar, nem pensar. O parente ainda existe, ainda poderia ser identificado como o anti-herói da história. O mais recomendável seria modificar alguns dados, lugares, tempo decorrido e acima de tudo características pessoais que, mesmo já alteradas para a história original, ainda tinham muita afinidade com as características reais do muso.

“Que maluca”, pensei com meus botões. “Como é que eu faço uma coisa dessas?” Deixei as folhas na primeira gaveta para voltar ao texto assim que tivesse tempo e fui tratar da vida.

Dois dias depois recebo um telefonema e não havia jeito de identificar a voz. Mas duas ou três frases foram suficientes: era ele, meu anti-herói. Uma pessoa que nem me passava mais pela cabeça voltar a ver. Primeiro porque estava morando longe do Rio – sabem onde fica Goiás Velho? Pois é. Segundo porque é um parente também longe – terceiro grau é quase não-parente. Sem saber o que dizer, soltei um que surpresa inexpressivo e esperei que me informasse o motivo do telefonema. Pois disse que estava de mudança para o Rio, tinha comprado um apartamento no Flamengo, ora em reforma, e queria saber se podia se instalar aqui em casa durante uma semana ou dez dias com a mulher e o cachorro. “Ouvi dizer que você tem um quarto vago.” Mesmo pensando depressa, não achei uma boa desculpa para evitar a fatalidade.

Moral da história: vieram, viram e gostaram tanto que ficaram hospedados no quarto que me serve de ateliê de pintura durante três meses. Além da mulher e do cachorro, que latia metade da noite em horários variados, vieram também uma cama desarmada e um horrendo jogo de sofá e poltronas que me atravancaram o corredor de entrada. Depois de um mês infernal, fui horrivelmente tentada pelo demônio da escrita a publicar o livro com a história dele sem trocar uma vírgula e fazer um lançamento em que fossem homenageados como queridos primos vindos de fora. Resisti bravamente e pensei que mais eficiente seria ajudar a concluir a reforma do apartamento do Flamengo. Que aliás ficou uma graça, com o jogo de sofá e poltronas logo na entrada e um pé de antúrios de plástico na mesinha de centro.

Os primos ficaram tão gratos que agora todo fim de semana vão almoçar lá em casa. O texto que Berta datilografou continua na gaveta, sabe Deus até quando. E o pior é que a história é boa pra caramba.


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A quem interessa possa - História Incompleta já tem novos lances!

segunda-feira

Ana Angélica


Encontrado em http://vilavelha.olx.com.br/procuro-moca-para-dividir-apartamento-em-vila-velha-iid-16435264


Fala de tanta coisa ao mesmo tempo que no fim não sobra nada.
Ana Angélica, um nome assim tipo arrebatador. Não que ela faça o gênero – um pouco tosquinha, simpática e boa pessoa. Impossível é seguir o fio de seus pensamentos ou manter uma conversa coerente que dure mais de três minutos. O pensamento de Ana Angélica é como um tobogã transparente por onde deslizam incontáveis pedaços de assunto, nomes que não se sabe de onde vêm, lembranças e sensações mal definidas, misturadas como meadas de várias cores. Ana Angélica não conta uma história, conta várias ao mesmo tempo, e no fim é preciso fazer múltipla escolha entre os trechos de enredo e os finais. Por qualquer motivo ela ri, ri muito, o que torna suas falas uma colagem de palavras incompletas mas coloridas.
Não, não é doida nem passa perto disso. É alegre e adora se divertir. Ninguém a encontra em casa nas noites de sexta ou a qualquer hora nos sábados, sendo que aos domingos vai à missa – diz que se faltar à missa alguma coisa muito ruim sempre acontece durante a semana – e dali parte para a praia se não chover. Depois almoça um churrasco em casa de amigos ou amigos de amigos, toma todas que aparecerem e vai dormir cedo porque segunda é dia de voltar ao posto de recepcionista de uma clínica de estética na Barra.
Tem um círculo de amizades surpreendentemente grande, variado e flutuante. Tem orkut, adora sexo na internet e faz questão de espalhar suas fotos em todos os sites de relacionamento. Já fez dois abortos, porque diz que só quer filhos depois dos trinta e cinco e ainda tem vinte e oito. Fica, namora, sai sempre com alguém, faz qualquer coisa para não ficar sozinha, mas nunca demora mais de quinze dias com o mesmo cara.
Acredito que isso acontece porque uma vez passou uns meses com um sujeito que a trocou por outra e fez de seu coração risonho uma gruta escura. Caiu em depressão, parou de comer, quase morreu sozinha em seu canto. Os amigos a salvaram do desespero, mas depois do luto, voltou à rotina de variedades que a mantém sempre com o olhar brilhando e os dentes bonitos de fora.
Ana Angélica não quer servir de exemplo pra ninguém. Não se responsabiliza, e como tem o coração fácil de derreter, chora com facilidade, mas logo se distrai e esquece. Vive cada momento, não pensa no futuro nem pára em lugar nenhum do passado. Alguém já disse que ela é como espuma, sempre efervescente e renovada. Ana Angélica se especializou em esquecer.

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Um elogio aos livros sem parecer pseudo-intelectual - parte 1Diretamente do Bitaites
(Postado em 20 de novembro de 2007)

Existem três tipos de livros: os que se leem devagar, os que se leem depressa e os que foram escritos para ocupar os espaços vazios na estante da sala. Estes últimos são quase todos vendidos pela Selecções do Reader’s Digest, pelo que vou apenas falar dos dois primeiros.
Os que se leem devagar não são muito diferentes dos que se leem depressa: ambos têm um determinado número de páginas que vamos virando (uma de cada vez, de preferência) com o objetivo de chegar ao fim. Tanto uns como outros têm páginas com palavras que formam frases e frases que formam parágrafos e parágrafos que formam mais páginas.
A principal diferença entre um livro que se lê devagar e um livro que se lê depressa está na velocidade com que queremos virar as páginas. Há livros que nos fazem virar as páginas mais devagar; outros deixam-nos tão ansiosos pelo final que viramos as páginas mais depressa.
Dito desta maneira, até parece que a Literatura é uma corrida – diferencia-a apenas a velocidade com que percorremos o caminho e a rapidez com que chegamos ao nosso destino. Claro que a Literatura não é a corrida ou a caminhada em si, mas o momento em que paramos para respirar.
Como as grandes virtudes da vida moderna costumam ser apenas as que se prestam à quantificação, é natural que quem entre na corrida não tenha pachorra para o chato que está sempre a parar por querer apreciar a paisagem.
Os livros que se leem depressa têm grande sucesso sobretudo quando a história «promete», pois folheamos as páginas com a maior rapidez possível. A ânsia é tanta que damos por nós a saltar parágrafos inteiros, se for preciso, só para chegar mais rapidamente ao fim.
Deve ser essa a sensação dos fãs do Harry Potter quando afirmam estar «em pulgas» para saber o que vai acontecer no último livro.
Embora estes saltos entre parágrafos pudessem ser terrivelmente prejudiciais para as obras que se leem devagar, no caso dos livros do Harry Potter não se perde nada – digo isto não como crítica destrutiva mas porque, do ponto de vista do clímax da história (a confrontação final entre Harry Potter e Voldemort), são irrelevantes os bocejos provocados pelo capítulo em que se narra uma festa de casamento entre dois feiticeiros do jetset mágico.

Continua


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Amigos e Profissionais da Leitura

Aberta as inscrições gratuitas para o Seminário A Viagem da Leitura

Estão abertas as inscrições para o seminário A Viagem da Leitura, dia 15 de setembro, 3ª f, das 9h às 17h30, na XIV Bienal do Livro – Rio.
Vagas limitadas. Não perca.

A grande viagem, ao redor do mundo e de nós mesmos que a leitura proporciona é o tema do Seminário A Viagem da Leitura, promovido pelas Secretarias de Estado de Cultura e de Educação do Rio de Janeiro. Nele serão apresentados diferentes meios de se chegar ao livro e à leitura, seja através do novo conceito de bibliotecas, de novas formas de leitura, de experiências inovadoras ou do olhar do escritor. Alcione Araújo, Heloisa Buarque de Hollanda, Ana Ligia Medeiros são apenas alguns dos nomes que apresentarão suas ideias.
Programação completa aqui.

O Seminário A Viagem da Leitura destina-se a professores, bibliotecários e profissionais da leitura e será conferido certificado. Inscrições gratuitas (formulário em anexo) pelo e-mail bibliotecapublica@bperj.rj.gov.br ou fax: (21) 2533-1415 até 11 de setembro.

Vagas limitadas. Não demore a se inscrever. Queremos você nesta viagem. Avise seus amigos.


Professores e bibliotecários tem acesso gratuito na XIV Bienal do Livro.
Saiba mais nesse site.

Serviço:
Dia 15 de setembro, 3f , das 9h às 17h30
Seminário A Viagem da Leitura
XIV Bienal do Livro
Riocentro
Av. Salvador Allende, 6.555 - Barra da Tijuca, RJ

Inscrições gratuitas até 11 de setembro:
bibliotecapublica@bperj.rj.gov.br ou fax: (21)2533-1415
Vagas limitadas

quinta-feira

Nem Drummond nem Quintana


Imagem sem menção de autor.


Fiquei tão gauche na vida
que pela esquerda posição em que me encontro
nem da esquerda faço parte.

O anjo torto voltou o rosto
resplendente
e disse apenas:
“Assim não é possível.”
Desviou os olhos,
retirou o amparo
e nem conselhos deu.
O anjo torto se foi
e depressa me esqueceu.

Acredito que tudo isso
seja só falta de um estilo próprio.
Afinal,
ninguém pode amar alguém
que não seja um outdoor de si mesmo
não saiba cantar
e nem ao menos saiba usar o photoshop.
Ninguém em sã consciência
entende tanta falta de cadência
tanta resignação ante o real
e tal falta de raça.

Qual é a graça de não ter respostas
e de viver entre livros e teclados
e nem ao menos se inscrever num chat
– maneira diuturna
de procurar sua turma?
Além de tudo os anjos
voltaram à moda
e agora vivem diante dos espelhos
comprados secretamente na Avon
descobrindo o prazer da própria imagem
insipientes narcisistas
intolerantes para com mortais
que lhes pareçam angélicos demais.


Publicado no Inscrições, 29 de junho de 2007.

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Na Folha de São Paulo de hoje, O Senado e a ética

domingo

Leituras e leituras

Não é esnobismo ou conservadorismo afirmar que é diferente ler pela internet e ler um texto impresso. A rede é a invenção maior do século passado, e cada vez mais põe a nosso alcance conhecimentos variados e importantes para quem vive hoje neste planeta, digamos, meio combalido e ameaçado. A rede é um must, e com certeza qualquer pessoa que possa ter acesso a ela tem uma vantagem de saída.

Mas a leitura impressa não foi suplantada por ela. Por quê? Acredito que o próprio processo de percepção se dá de modos diversos nos dois casos: muito rápido e cercado de outros estímulos pelo monitor, que supõe tempos abreviados para cada atividade e até torna difícil a leitura de um texto mais longo. Um texto impresso supõe algum silêncio e um ambiente propício a uma atenção mais intensa, o que ajuda a compreender e assimilar melhor o que se lê, além de desenvolver o senso crítico do leitor, coisa que anda escassa em nosso mundo.






Ler é imprescindível para quem deseja ser capaz de pensar e viver a própria vida. Além disso, é indispensável para que se aproveite mais e melhor o saber e a informação que vêm através da internet. É uma espécie de conhecimento prévio, uma base de saber e uma iniciação para perceber melhor o mundo e o que acontece nele.










Vídeo da campanha de incentivo à leitura idealizada e produzida por Deborah Toniolo, Marina Xavier, Julia Brasileiro, Igor Melo, Jader Félix, João Paulo Moura, Luciano Midlej, Marcos Diniz, Paulo Diniz e outros.



Visite também o site www.lerdeviaserproibido.com.br
Espalhe essa idéia!