quarta-feira

O Espírito Sobrenadará



Estilo metafísico (à maneira de Austregésilo de Athayde) – Millôr 1949

Tenho que Chapeuzinho Vermelho, essa pobre moça vítima das insídias do Lobo Mau, não está sozinha nesta Batalha de Eras. Envolvida no ardil torpe de um ser altamente experimentado nas artimanhas de nosso tempo ela se deixou sucumbir. Não deduzamos, porém, loucamente, que tudo esteja perdido.
A floresta em que Chapeuzinho se perdeu é o próprio símbolo dos desvios e perigos a que estamos sujeitos neste mundo sem Fé. E quando ela pergunta e pede informações em sua inocência fundamental, quem a guia e orienta é justamente um ser da pior espécie. Já a própria primariedade do ardil empregado indica a pureza da jovem. Outra, de maiores recursos imorais, experiente na lógica prática da vida, teria compreendido e resistido ou se perdido para todo sempre.
Conheci Chapeuzinho Vermelho quando me dirigia para a Missão Livingstoniana, logo depois de terminada a Grande Guerra. Sei por isso que não pensou, dada a pureza que lhe reconheci, nas diferenças primaciais entre sua Avó e o Lobo. Isso a salva e aniquila o valor do Mal. E bastaria que dessa catástrofe sobrasse a glória de sua inocência, para que qualquer homem de Bem pudesse continuar a crer na sobrevivência do amor. Pois está no plano da natureza que a alma é mais importante que o corpo, e, salva a parte mais importante da criatura humana em Chapeuzinho, está salva com ela a humanidade.
Millôr Fernandes


Este é o início de uma série de considerações sobre essa história. Todas escritas por Millôr Fernandes, que nos deixou sem sua verve há dias, e que merece nossas reprises.

10 comentários:

jurisdrops disse...

Eta mundaréu de ideias fantásticas!
Beijos

Dario B. disse...

Já há sessenta anos a ironia pairava fina, nos escritos deste que, sem duvida alguma, foi um dos maiores artistas e intelectuais brasileiros. Obrigado por trazer o texto.

mfc disse...

MIllôr era um doce com os doces e um áspero com os ásperos!!
As minhas homenagens...

Unknown disse...

Millor era GIGANTE em tudo.

Nunca acreditei nesta estória. Principalmente quando li a versão de Marcelo Novaes.

Excelente!

Beijos

Mirze

AnaC disse...

Ele era genial mesmo. Agora quero ver as outras versões.

Beijnhos.

dade amorim disse...

Ele era assim, Maria Teresa.

Beijo.

dade amorim disse...

Obrigada a você, Dario, pela visita e comentário.

Abraço grande.

dade amorim disse...

Gostava dele como de um amigo, mfc.

Beijo.

dade amorim disse...

Poia é, Mirze. Marcelo é outro talento.

Beijo beijo.

dade amorim disse...

As outras versões (não todas) estão aí no post seguinte. TOmara que goste, Aninha.

Beijocas.