sexta-feira

Os esqueletos no armário



A meu ver, o papel – e atrativo – principal da assombração é que ela manifesta aquilo que está desde sempre dentro de cada um de nós, mas vive preso, escondido no porão, trancado a sete chaves porque, uma vez liberado, faria de nós seres indesejáveis, incapazes de conviver em sociedade e politicamente incorretíssimos. A figura do estranho, da pessoa ou coisa que provoca horror ou medo, não seria tão ambígua e atraente se não correspondesse a alguma coisa com que todos estamos secretamente familiarizados – embora pensemos sempre nessa coisa como uma entidade com existência própria. Assombração não é feita para assustar (embora em geral assuste, por uma espécie de efeito colateral). O estranho existe para nos fazer viver a vida de modo mais completo, já que viver é muito mais do que pagar contas no banco, namorar ou ir ao cinema.
Expor os sentimentos humanos mais sombrios e escondidos sob a forma de seres ou fatos enigmáticos e sinistros pode ser um modo criativo e muito refinado de ampliar o conhecimento do mundo e das pessoas, visto de uma perspectiva nova e esteticamente rica. Uma percepção que não obedece ao habitual e rotineiro pode nos abrir os olhos para ideias como a do tempo em sua dimensão esmagadora e implacável. Pode nos dar a perceber, como num espelho, o vazio que cada um de nós carrega vida afora, por mais que conquiste sucesso, dinheiro e até amor e amizade.

4 comentários:

Bípede Falante disse...

De onde vem esse vazio que a gente não aprende a alimenta-lo???

Beijoss

mfc disse...

Gostei muito desta análise interior e do reconhecimento de como realmente somos!
Como gosto de pessoas capazes de se pensarem!
Beijinhos.

dade amorim disse...

Tem razão, Lelena.
Beijo beijo.

dade amorim disse...

Assim como você, com certeza...

Beijo!