Conheci Técio no esplendor de meus dezoito aninhos. Não se
fazia blog nem se usava e-mail naquele tempo. As mensagens vinham por bilhetes,
cartas, telefone. Ninguém era amigo virtual, não se namorava por chat e muito
menos se imaginava uma paixão em que um não conhecesse o outro na real. A não
ser em romances ingleses, o amor precisava dos sentidos físicos para existir. A
começar pela visão, passando pelo som da voz, uma que outra incursão táctil,
até que se desse a implosão, o tremor de terra de que falava Luís Vilela num
conto que inaugurou gloriosamente sua carreira de escritor.
Uma crônica de Martha Medeiros fala daqueles homens que vão
logo avisando: “sou um cara difícil”. Eu devia ter lido essa crônica naqueles
dias ditosos, que logo deixaram de ser tão ditosos assim, porque Técio tinha o
perfil que a cronista descreve. Incauta, achei aquilo o máximo. Ao mesmo tempo
que me enchia os olhos, o gato convocava em mim minas de ternura, sentimentos
maternais, e ainda por cima, inexperiente e boboca como se costumava ser
naquele tempo (e até hoje ainda se é um pouco aos dezoito, apesar de todas as
revoluções das últimas décadas), me sentia a eleita entre todas as mulheres.
Ele confiava em mim, se abria comigo, mostrava como lhe fazia bem contar com
minha atenção e carinho.
Logo o lado difícil de Técio destruiria o que seu lado
sedutor tinha construído. Não podia deixar suas paqueras porque era
“emocionalmente muito instável”. Jogava flores em minha janela e escrevia
poemas na calçada porque era um “passional”, mas no dia seguinte sumia sem dar
notícias. Voltava como se nada tivesse acontecido e de repente armava uma cena
patética de ciúme em qualquer lugar. Um dia entrou pela casa a dentro e invadiu
meu armário procurando alguma coisa que confirmasse “uma suspeita que o
torturava”. Percebi de repente que nada mais interessava a Técio senão seus
próprios rompantes, o impacto que causavam suas palavras exaltadas, o culto que
mantinha por sua personalidade azuretada.
Por sorte, mesmo as mocinhas românticas podem ter algum bom senso. Algumas não sabem como usá-lo e até casam com um Técio, que para
mim passou a ser sinônimo de egocêntrico irresponsável. Antes que minha vida
virasse um caos de lágrimas onde não haveria lugar senão para ele, desapareci
do mapa. Quando voltei, havia bilhetes, cartas, presentes e flores murchas que
minha mãe foi empilhando num canto do quarto. Joguei tudo num grande saco
plástico trazido por ela. O saco deslizou pela lixeira quase sem ruído.
4 comentários:
A intuição que faz afastar desses estrupícios, mas às vezes falha, né? (rs*) Bom restinho de semana! Beijus,
Tomaste uma decisão acertadíssima!
Livra!!
Dade!
Sou do tempo das "bobocas" e continuo sendo. Tenho um estrupício e não condigo dar o pulo do gato.
!o saco deslizou pela lixeira quase sem ruído! Lindo o silêncio deste momento.
Beijos
Mirze
Isso é o que eu chamo de salva pelo gongo...
Beijosss
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