Tela de Louis Aston Knight.
Novela é uma ficção em câmera lentíssima,
que se arrasta por meses inumeráveis pra contar uma história que caberia em uma
semana. Ou não, porque afinal tem muitos núcleos, como diz o pessoal da
produção. Mas em quinze dias dava pra matar aquele drama de gente de família,
sem família e antifamília que se engalfinha, associa, trai ou vira as costas
uns aos outros. Isso se percebe acompanhando o folhetim desde o começo, todo
dia, pulando semanas ou de dois em dois meses, porque é incrível o quanto um
autor de novela consegue esticar a trama, repetindo situações, repisando coisas
já ditas e reditas, explorando a paciência dos atores, alguns dos quais ótimos
profissionais que mereciam melhor destino.
Existem as do tipo pastelão, as “sérias”
– que em geral viram chatas mesmo – ou as razoavelmente assitíveis, quando
existe um roteiro bacana, algum suspense bem articulado, humor inteligente ou emoção
genuína. Coisa rara. Quase sempre a novela escorre ralinha, escorada em um
visual que atrai – paisagens, decoração, arquiteturas, modas, gente bonita – e
serve para encher o tempo e refrescar os olhos de quem gostaria de frequentar
os restaurantes mais caros da zona Sul (o que se come em novelas tipo a das
nove é uma grandeza), tomar aquele café da manhã todo colorido, dar festas de
arromba e comprar os modelitos que as moças desfilam. Pra não ficar doce
demais, tempera com algum sofrimento em cenários de luxo e prova com uma cena
de sangue que viver na favela não compensa (pano rápido, por favor, que ninguém
precisa ficar poluindo a visão com essas baixarias).
Mas enquanto os personagens ruminam seus
dramas pessoais, quase sempre bem mesquinhos, o mundo em geral passa em brancas
nuvens (exceto quando chove no script) e se engorda o hábito alienante que as
pessoas têm de relegar ao limbo da indiferença o que não for de interesse
imediato.
A gente vive num planeta de uma
constelação de uma galáxia do universo, do qual – surpresa! – se diz que é
plano e avança sem parar entre espaços negros que não se descobriu ainda em que
consistem. Sabe-se pelas mídias que o planeta Terra está aquecendo, tem
mostrado um mau humor literalmente tempestuoso e as geleiras, que dormiam há
tanto tempo, quietinhas em suas montanhas polares, estão de repente soltando
pedaços, icebergs que derretem e fazem subir o nível da água dos oceanos,
mudando climas e estações. Há quem culpe a ambição capitalista por suas
emissões de carbono, mas há também quem acredite simplesmente que se trata de
um ciclo na vida do planeta, tipo dos que se sucedem há milhões de anos. Pode
ser que as duas coisas estejam pesando, mas não queremos pensar nisso.
Enquanto tudo acontece, nós, os
noveleiros, ficamos diante da tevê ligadões no drama de alguém, na chatice de uns
tantos e na maluquice de outrem, sem falar no mau humor do/a vilão/ã. Não
interessa saber que bicho vai dar ou vai sumir, como os dinossauros sumiram em
uma era passada. Preferimos não pensar no assunto, que afinal cabe aos
cientistas estudar e explicar. Mas será que é melhor esquecer que moramos numa
grande área de risco, não uma encosta aterrada sobre um lixão, mas a terra que
treme, se abre, e que o mar pode engolir?
Nada disso precisa nos arrasar e deixar
pessimistas ou aterrorizados. Afinal, é provável que esse ciclo demore séculos,
que o homem aprenda a lidar melhor com as catástrofes naturais e que se
descubram meios de ampliar ainda mais o tempo da vida humana, porque as
pesquisas e a ciência têm feito verdadeiros milagres. E se isso não acontecer,
continuamos a ser os mortais de sempre – grande novidade – só que agora com um
estímulo a mais para descobrir coisas novas que nem as novelas, o consumismo ou
o voyeurismo vão nos dar.
6 comentários:
Outra camada da realidade, que novelas e consumismo tentam maquiar por interesses de $$$.
Bom trabalho, Dade.
Beijos.
Não vejo quase novelas. Ou não vi, que o tal Pereirão da Globo tem caído na minha salada rsrs
Preciso dar um jeito nisso que a fruta não é das melhores!!!
Eles conseguiram fartar-me de as ver!
Estou curado!
Estamos de acordo, Kellyzita.
Beijocas.
Defenda-se deles, Lelena!
Beijos pra você.
Parabéns por isso, mfc.
Um abração.
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